Geralmente, quando pensamos em “urgência” e “emergência” médicas, associamos essa situação a algum tipo de dor aguda. Além da dor, outros sintomas como o inchaço do abdome, também conhecido por distensão abdominal, taquicardia, náuseas e vômitos podem estar associados, caracterizando o quadro de abdome agudo. Trata-se de um quadro grave, que merece uma avaliação médica imediata.
É possível existir alguma urgência ou emergência ginecológica? Quais são as possíveis urgências ginecológicas?

Rotura de cisto ovariano

Durante o ciclo menstrual, os ovários produzem os chamados folículos, também conhecidos como cistos foliculares ou cistos funcionais. Existem outros tipos de cistos ovarianos, como os cistos de corpo lúteo, os teratomas e os endometriomas. Todos guardam em comum o fato de serem cistos, ou seja, “bolsas” que possuem conteúdo líquido.
A rotura de cisto de ovário pode ocorrer com qualquer cisto ovariano que se rompa, deixando o líquido que estava em seu interior cair dentro do abdome.
Acontece com frequência nos cistos funcionais e nos cistos de corpo lúteo, sendo menos frequente nos teratomas e nos endometriomas, por exemplo.

Quais são os sintomas?
A mulher sente dor, geralmente súbita, possivelmente intensa, e costuma estar associada a distensão abdominal. Além da dor, sintomas como taquicardia, náuseas, vômitos, queda de pressão arterial e fraqueza podem estar presentes e indicar a existência de perda sanguínea.

Como é feito o diagnóstico?
Além dos sintomas descritos, o médico pode suspeitar de rotura de cisto ovariano durante o exame físico e solicitar exames de imagem (como as ultrassonografias transvaginal e pélvica) ou laboratoriais para auxiliá-lo na confirmação do diagnóstico.

Como é o tratamento?
Nos casos em que a perda sanguínea é estável e os sintomas não são intensos, a conduta conservadora (não cirúrgica) pode ser uma opção, mas sempre com intensa e cuidadosa vigilância médica, mantendo suporte clínico e controle da dor, muitas vezes resultando em involução do quadro.
Algumas vezes, no entanto, a dor pode ser bem intensa, acompanhada dos sinais de perda sanguínea e caracterizar o quadro conhecido como abdome agudo ginecológico.
Trata-se de uma urgência médica com risco para a vida da mulher, sendo fundamental que a avaliação pelo médico seja feita o mais rápido possível.
O tratamento cirúrgico é indicado nesse caso e tem o objetivo de conter o sangramento, retirar o cisto roto e preservar o restante do ovário quando possível. A via de cirurgia preferencial é a laparoscopia por se tratar de uma cirurgia minimamente invasiva. Nos casos com instabilidade clínica, a opção pode ser a cirurgia convencional de urgência.

Torção anexial

Chamamos de “anexo” os órgãos e estruturas compostos pelos ovários, tubas uterinas e pelos seus vasos sanguíneos e ligamentos.
Quando ocorre uma rotação completa ou parcial do ovário ou tuba em seus
ligamentos de suporte, temos o quadro de torção anexial, o que acarreta a diminuição do aporte sanguíneo e o consequente comprometimento da vascularização do órgão afetado.
Representa de 2,5% a 5,0% das emergências ginecológicas e está relacionada a cistos ovarianos e paraovarianos em 64% a 82% dos casos, sendo a indução da ovulação e a hiperestimulação ovariana fatores de risco associados.
Quais são os sintomas?

Os principais sintomas são dor abdominal e distensão abdominal. Dependendo do grau de torção e do tempo decorrido, pode levar a sintomas como taquicardia, náuseas, vômitos, queda de pressão arterial e fraqueza.
Como é feito o diagnóstico?
A suspeita de abdome agudo pode ser feita pelo quadro clínico e exame físico. A ultrassonografia transvaginal ou pélvica pode auxiliar no diagnóstico, muitas vezes permitindo a visualização do comprometimento da vascularização do ovário.
Como é o tratamento?
O tratamento costuma ser cirúrgico por laparoscopia ou laparotomia, dependendo do caso. Embora a literatura médica descreva haver possibilidade de distorção do anexo com posterior reavaliação do fluxo sanguíneo em casos selecionados, frequentemente a torção anexial leva a importante prejuízo da vascularização do anexo, sendo necessária a retirada da tuba uterina, do ovário ou de ambos.

Abscesso tubo-ovariano

É uma complicação grave da doença inflamatória pélvica, doença caracterizada pela infecção do trato genital superior (útero, trompas e ovários) geralmente associada a agentes sexualmente transmissíveis como a Neisseria gonorrhoeae (“gonorreia”) e a Chlamydia trachomati (“clamídia”), embora já se saiba que é um processo polimicrobiano.
O abscesso tubo-ovariano pode se romper, conferindo ainda mais gravidade ao quadro.
O quadro pode favorecer o surgimento de aderências pélvicas e levar a complicações futuras como infertilidade e dor pélvica crônica.

Quais são os sintomas?
Os principais sintomas incluem dor abdominal, geralmente em topografia pélvica, associada a febre e secreção vaginal com odor, dor na relação sexual (dispareunia), dor lombar e, nos casos mais graves, sinais toxêmicos como taquicardia, confusão mental e choque.

Como é feito o diagnóstico?
A hipótese diagnóstica é feita pelo médico, com base na história clínica e no exame físico, auxiliada por exames laboratoriais e de imagem (tomografia computadorizada ou ultrassonografias pélvica ou transvaginal).

Como é feito o tratamento?
O tratamento é feito com antibióticos de amplo espectro de ação, cuja administração deve ser feita em ambiente hospitalar, associada ao tratamento cirúrgico por laparoscopia ou laparotomia para drenagem e limpeza da cavidade pélvica.
Todos os parceiros recentes nos últimos seis meses devem ser convocados e
receberem tratamento medicamentoso (antibióticos) de acordo com a suspeita clínica.
Estima-se que cerca de 70% das mulheres infectadas por clamídia sejam
assintomáticas, reforçando o alerta da necessidade de prevenção de infecções sexualmente transmissíveis.
Além disso, uma vez confirmada a suspeita clínica, sempre que possível devem ser feitos também testes sorológicos para verificar a existência de coinfecção por outros agentes como sífilis, hepatite B, hepatite C e HIV.

Gestação ectópica

Também conhecida como gravidez ectópica, é considerada uma urgência obstétrica e ocorre quando há implantação da gestação (blastocisto) em local inadequado, ou seja, diferente da cavidade uterina.

Felizmente é uma situação rara que aparece em cerda de 1% a 2% das gestações e, embora possa ocorrer em várias localizações, como a cavidade abdominal e o colo uterino, acomete mais frequentemente uma das tubas uterinas.
A gravidez começa a se desenvolver fora da cavidade uterina e o feto pode crescer por algumas semanas. Com o crescimento, pode ocorrer a ruptura do local (tuba uterina, por exemplo), levando a uma hemorragia interna que pode ser fatal, caracterizando a urgência médica.
Algumas situações que danifiquem as tubas podem elevar o risco do desenvolvimento de gravidez ectópica, tais como a presença de patologia tubária, cirurgia tubária prévia, gestação ectópica prévia, laqueadura tubária, endometriose, doença inflamatória pélvica, falha em dispositivo intrauterino ou a utilização de reprodução assistida. Estudos indicam que o tabagismo aumenta a incidência de gravidez ectópica.

Como é feito o diagnóstico?
Os principais sintomas incluem suspeita ou confirmação de gestação, associada a dor abdominal, sangramento vaginal, mal estar, náuseas e fraqueza, que podem ser confundidos com os sintomas de outros diagnósticos, como a rotura de cisto ovariano e a torção anexial.
O diagnóstico é feito pela história clínica, exame físico auxiliado por exames laboratoriais (βHCG, hemograma) e de imagem (ultrassonografia transvaginal).

Como é feito o tratamento?
O tratamento conservador com medicação específica (metrotrexato) pode ser realizado em casos selecionados com o objetivo de que a gestação seja “absorvida” pelo organismo e, com isso, a tuba seja preservada. Entretanto, o tratamento cirúrgico é frequente e costuma ser realizado preferencialmente por laparoscopia. A gestação ectópica é retirada cirurgicamente e, em muitos casos (gestação ectópica tubária), há necessidade de retirada da tuba uterina comprometida (salpingectomia).
Embora as mulheres que apresentaram gestação ectópica tenham maior risco de nova ocorrência, como já mencionado, na maioria dos casos poderão tentar engravidar novamente.

A gravidez ectópica pode evoluir com feto vivo?
A gestação ectópica abdominal é descrita na literatura médica como única
possibilidade de uma gravidez ectópica gerar feto vivo.
É um evento raríssimo sendo um número em torno de 10 para 100.000 nascidos vivos e que raramente leva a sobrevivência neonatal. Deformidades em membros e na cabeça fetal também são verificadas.

A mulher cursa com sintomas importantes decorrentes da gravidez extrauterina como dores abdominais, sintomas gastrointestinais (náuseas, vômitos e constipação) e pode levar a hemorragia materna grave devido a inserção da placenta em órgãos nobres como o fígado.
Devemos enfatizar a importância de procurar o médico tão logo se tenha a suspeita ou a confirmação da gravidez, pois o exame físico e a ultrassonografia viabilizam o diagnóstico precoce da gravidez ectópica e a imediata intervenção, melhorando as chances de preservação tubária.